Chamo ao longe o meu pai, que se ocupa agora de pequenas tarefas. Desce as escadas com cautela, medindo os degraus, e vai regar as alfaces, buscar o pão fresco. Agora vem ao meu encontro. Um sorriso contido. Entra com cerimónia na casa que me propôs recuperar. Então sentamo-nos de frente para o limoeiro, uma imagem que me conforta nestes dias: o amarelo que irrompe das folhas verdes e nos faz sombra e sumo.
Fico ali sentada a ouvir o meu pai desfiar as lembranças de um tempo em que foi feliz. Olha muitas vezes para as gravuras com o espanto que ainda não conhece resposta ou razão. E ali no meio de um discurso fluido reconhece muitas vezes os seus erros. Desde que a minha mãe morreu que se despede sempre de mim com “desculpa por alguma coisa”.
Passadas décadas sobre o silêncio que se fazia à mesa para calar as revoltas da adolescência, observo agora o meu pai a contemplar as gravuras na parede. Vejo com ele as que restaram no livro. Há melros e borboletas enfeitiçados pelo pólen que delas se liberta. Vejo o que sobrou do livro com o meu pai, como antes o fiz com a minha mãe, com ela saboreando uma vida que ainda não tinha sido interrompida.
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