A dois dias das eleições mais interessantes dos últimos anos, mantenho aquilo para o qual venho chamando a atenção aqui nesta coluna, no podcast “Maquiavel para Principiantes” e na CNN. É muito difícil vislumbrar hoje o que vai sair do veredicto dos portugueses nas urnas.

Qualquer cenário é possível e tanto lá em cima na disputa entre PS e PSD, como nos partidos mais pequenos, onde as oscilações são diárias e difíceis de detectar pelas empresas de sondagens, tudo pode mudar.

Aliás, costumo reforçar que não acredito em estudos de opinião, mas confio na minha intuição de 25 anos de carreira como jornalista e depois consultor de Comunicação e na percepção das dinâmicas de campanhas políticas.

Até ao início da semana notou-se movimento ascendente do PSD e IL face a um quarto minguante da esquerda onde, posso apostar com o caro leitor, BE e PCP não vão repetir os 19 e 12 deputados, respectivamente, de 2019. E é do lado de Catarina Martins que se sentirá uma maior permeabilidade à ameaça do voto útil da esquerda no PS.

Depois da inflexão de António Costa ao colocar o objectivo da maioria absoluta na gaveta e anunciar uma nova postura de bacalhau com todos, isto é, disponibilidade para conversar com todos os partidos, excepto o Chega, em caso de não haver uma maioria clarificadora, o PS voltou a encarrilar e sobe a sua vantagem sobre o partido rival.

A última semana foi o que é hábito, nada mudou. Pingue-pongue de soundbytes, graçolas, inutilidades, o diz-que-disse e mais uns animais de estimação estrelas de redes sociais. Se espremêssemos o conteúdo era zero ou no mínimo um sumo azedo sem qualquer substância e consistência. Com maior tensão no ar.

Domingo à noite veremos o que vai acontecer. Se alguma coisa se inverteu ou se houve uma daquelas mudanças à Lampedusa, “tudo muda para que tudo fique na mesma”. A governabilidade foi o tema que se impôs neste mês, exactamente por estarem nove partidos em combate e o futuro se adivinhar com muitas nebulosas.

Esse cenário incerto só não ocorrerá em caso de uma maioria absoluta de PS ou PSD. Se houver um empate pode existir um impasse e a imprevisibilidade agravar-se-á e muitos se interrogarão para que serviram estas eleições.

E aí outro protagonista que tem estado sossegado e em silêncio, só enviando mensagens pelos porta-vozes habituais a escrever na imprensa e a falar na televisão, que já não enganam ninguém, terá de dar a cara: Marcelo Rebelo de Sousa. Se tudo ficar emaranhado e Portugal correr o risco de uma italianização do regime com eleições atrás de eleições em poucos anos, é assim que o Presidente da República ficará para a história, o que não será glorioso, como imaginam.

Marcelo terá de estar preparado para ser a solução de um puzzle de complexa solução. Veremos se tem unhas de estadista responsável para tocar esta guitarra, que poderá ser triste. Como o nosso fado.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.