Lisboa está há três meses sem provedor do animal

Antiga provedora terminou o mandato no fim de Agosto. Abandono de animais aumentou durante a pandemia e trabalho de coordenação entre várias entidades tornou-se mais relevante.

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O abandono de animais aumentou durante a pandemia Fabio Augusto

Há três meses que Lisboa não tem provedor municipal dos animais. A anterior provedora terminou o mandato a 31 de Agosto e até ao momento não foi nomeado um substituto. O assunto terá ficado esquecido na transição entre executivos da câmara e o novo vereador responsável foi alertado para a situação há cerca de duas semanas.

Desde que Marisa Quaresma dos Reis abandonou o cargo, as denúncias, queixas ou pedidos de esclarecimento só não caem em saco roto porque nas instalações da provedoria, num prédio da Rua do Ouro, se mantém a trabalhar uma funcionária administrativa que os encaminha para os serviços camarários ou entidades externas. Deixou de haver, contudo, uma figura capaz de fazer trabalho articulado com as associações, a câmara e as juntas de freguesia.

Desde o início da pandemia que se tem registado um aumento do abandono e uma redução das adopções de animais em Portugal. A morte dos tutores e o desinteresse ou incapacidade das famílias em cuidar dos bichos é uma das razões apontadas, assim como a crise e o desemprego que atingiram vários sectores da economia. Um fenómeno de que a imprensa britânica tem dado conta, do qual ainda não existem relatos por cá, é o do abandono de animais que tinham sido comprados ou adoptados durante os confinamentos de 2020.

Maria do Céu Sampaio, presidente da Liga Portuguesa de Defesa dos Animais, diz que a provedoria “foi muito importante” para a coordenação entre diferentes entidades neste período pandémico, pois permitiu acudir às situações urgentes de forma mais célere. Mais do que o trabalho com a câmara, destaca a aproximação às juntas de freguesia, que muitas vezes têm um conhecimento mais profundo e rápido do que se passa.

“A [criação da] provedora do animal em Lisboa foi uma coisa muito importante para a causa animal”, afirma a dirigente, referindo-se a Marisa Quaresma dos Reis como “uma provedora muito actuante e com belíssimo relacionamento com as associações.” No entender de Maria do Céu Sampaio, a jurista e docente universitária devia até manter-se no cargo.

Mas o regulamento do provedor não o permite, estabelecendo que os mandatos são de quatro anos e não podem ser renovados. Desde que o cargo foi criado, em 2013, Marisa Quaresma dos Reis foi a única provedora a cumprir o tempo na totalidade. Marta Rebelo demitiu-se menos de dois meses depois de ter tomado posse e Inês Sousa Real, actual líder do PAN, saiu ao fim de dois anos e meio. Ambas saíram com duras críticas à autarquia por não dotar a provedoria de recursos humanos e financeiros e por engavetar todas as suas recomendações.

Também Marisa Reis se queixou do mesmo em entrevista ao PÚBLICO em Junho de 2018 e a situação não melhorou entretanto. A provedoria nunca teve um jurista, reclamado há vários anos, e, em Janeiro do ano passado, o gabinete chegou a funcionar com apenas a própria provedora, encarregada de atender telefones, gerir a página de Facebook, elaborar pareceres e recomendações. Nos vários relatórios semestrais disponíveis no site da provedoria estão evidentes os desencontros entre Quaresma dos Reis e a vereação. A provedora chegou mesmo a apresentar a sua demissão a Fernando Medina em Setembro de 2020, mas recuou porque lhe foi “prometida maior atenção à provedoria por parte da CML”.

O município de Lisboa foi pioneiro na criação de uma provedoria específica para os animais, que hoje existem igualmente em Santa Maria da Feira, Ovar, Almada e na Madeira. Açores, Braga e Castelo Branco aprovaram este ano a criação dessa figura. E em Agosto tomou posse a provedora nacional, Laurentina Pedroso, antiga bastonária da Ordem dos Veterinários, que está na dependência do Ministério do Ambiente.

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