Cultura

Muitos dos seus trabalhos mais brilhantes começaram com acasos, mortes, desgostos de amor. Eis Sophie Calle

5 dezembro 2021 10:01

João Pacheco

É fácil percebermos que Calle é uma das artistas contemporâneas mais originais e conceituadas em todo o mundo. Até 22 de abril, tem uma grande exposição no Centre Pompidou Málaga, em Espanha

5 dezembro 2021 10:01

João Pacheco

Antes de mais nada viajou pelo mundo. Depois foi stripper em Pigalle, em 1979/80. Posou nua em troca de uma aula de fotografia que não conseguia pagar. Desistiu das aulas, mas não da fotografia. Seguiu estranhos na rua, fotografou-os e tomou notas sobre o que faziam a determinada hora. Trabalhou três semanas como empregada num hotel em Veneza, para melhor espiar os hóspedes. Quis casar-se na pista de um aeroporto, mas um desastre de aviação furou-lhe os planos. Passou uma noite no topo da Torre Eiffel, pedindo aos visitantes que lhe contassem histórias para não adormecer. Quando a mãe morreu, levou até ao Polo Norte o anel de diamantes que herdara e deixou-o no gelo. Homenageou o gato de estimação com um álbum de música que tem a participação de 40 músicos, incluindo Laurie Anderson, Pharrell Williams e Bono. Muitos dos seus trabalhos mais brilhantes começaram com acasos, mortes, desgostos de amor. Uma instalação partiu da morte da mãe, outra nasceu do último telegrama enviado por um namorado que a deixou.

Chama-se Maria Turner no livro “Leviathan”, do escritor norte-americano Paul Auster. O nome real é Sophie Calle. E até 22 de abril tem uma grande exposição no Centre Pompidou Málaga, em Espanha. É fácil percebermos que Calle é uma das artistas contemporâneas mais originais e conceituadas em todo o mundo. Será mais difícil identificar as fronteiras entre a ficção, a vida real e a intimidade da artista, nas criações que tem exposto e publicado ao longo de 40 anos. Essas eventuais fronteiras nem importam, porque o principal material de trabalho de Calle é mesmo a própria vida.