Economia

Lagarde insiste que Pacto de Estabilidade e Crescimento tem de ser atualizado

Lagarde insiste que Pacto de Estabilidade e Crescimento tem de ser atualizado
Reuters

É fundamental que a revisão do PEC por parte dos líderes europeus esteja concluída quando terminar a suspensão das regras do défice e da dívida que foram postas de lado durante a pandemia, reafirmou esta segunda-feira a presidente do Banco Central Europeu numa audiência no Parlamento Europeu. Christine Lagarde, no seu segundo "diálogo monetário" deste ano com os eurodeputados, respondeu a Pedro Silva Pereira que a 'bazuca' europeia é fundamental para contrariar o risco de políticas de austeridade e fomentar a modernização das economias do euro

"Vejo motivos para a atualização do Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC). Idealmente essa revisão deveria estar concluída quando a cláusula de suspensão [das regras] for desativada", reafirmou esta segunda-feira Christine Lagarde, via videoconferência, perante os eurodeputados no segundo "diálogo monetário" deste ano entre o Parlamento Europeu (PE) e o Banco Central Europeu (BCE). As regras foram suspensas em março de 2020 face à pandemia da covid-19 e Bruxelas espera que só sejam reativadas em 2023. Deste modo, no entendimento de Lagarde, os governos europeus dispõem de ano e meio para se entenderem na sua revisão.

Apesar de o BCE e da política monetária não se envolverem na política orçamental definida pelos governos da zona euro, a presidente do BCE defendeu esta segunda-feira perante a Comissão de Assuntos Económicos e Monetários do PE que o "contexto mudou" desde que as principais regras de ouro - nomeadamente do limite de 3% para o défice orçamental e do teto de 60% para a dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto - foram estabelecidas em 1997.

Lagarde recordou aos eurodeputados que tais regras levaram a políticas pró-cíclicas - vulgarmente conhecidas por austeridade - que agravaram a crise das dívidas soberanas há dez anos na zona do euro. "As políticas [orçamentais] pró-cíclicas têm efeitos limitados" e obrigam depois os bancos centrais - no caso, o BCE - a serem "os únicos atores em cena". Na prática são os 'bombeiros' de serviço na injeção de estímulos (monetários) nas economias aflitas. O que, aliás, o BCE fez, recorde-se, desde que reduziu a taxa diretora de juros desde novembro de 2011 (após a entrada de Mario Draghi para presidente) até ao mínimo histórico de 0% em 2016 e avançou com os programas de compra de ativos desde 2014, que se mantém e foram reforçados por Lagarde com o lançamento de um programa de emergência conhecido pela sigla PEPP com um envelope financeiro de €1,85 biliões.

Sobre os novos limites e tetos à política orçamental dos governos que as regras de Maastricht revistas possam vir a impor a partir de 2023, Lagarde não se pronunciou. "Tudo depende do debate" entre os líderes políticos europeus, rematou.

Bazuca é fundamental para contrariar austeridade

Dentro da mesma lógica de evitar a tentação de novas políticas orçamentais de austeridade durante a recuperação do colapso económico provocado pela covid-19, a presidente do BCE elogiou a chamada bazuca europeia e a "rapidez" com que foi montada. Lagarde, por diversas vezes nesta sua intervenção no Parlamento, sublinhou que atualmente continua a ser indispensável um alinhamento entre as politicas monetária e orçamental no sentido do apoio às economias e que qualquer aperto dessas políticas "é prematuro".

Em resposta a uma intervenção elogiosa do eurodeputado português Pedro Silva Pereira, do Grupo da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas no Parlamento Europeu, Lagarde sublinhou que a 'bazuca' europeia - conhecida pela sigla Next Generation EU - que vai financiar os Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) de cada país tem um duplo efeito: "no curto prazo, evitar as políticas pró-cíclicas e no longo prazo fazer a modernização das economias europeias".

Não se pronunciando sobre o concreto desses PRR, nomeadamente sobre o sentido e o equilíbrio entre investimentos e reformas, a francesa sublinhou que o decisivo é "a implementação".

Neutralidade nas compras de ativos não está inscrita no mandato

Apesar de não ter fornecido conclusões ou tendências sobre o debate em curso na revisão estratégica que o BCE está a levar a cabo sobre a sua política, e que deverá concluir antes do final deste ano, Christine Lagarde abriu a porta à alteração das regras de aquisição de ativos nos programas em curso acomodando a preocupação com a intervenção do banco central na luta contra a mudança climática.

A presidente do BCE admitiu que a "neutralidade de mercado" que impede privilegiar este ou aquele ativo nas operações de mercado é algo "que não está inscrito no mandato" do banco. O que o Tratado exige que o BCE aplique os princípios de "mercado aberto e de livre concorrência e de alocação eficiente". Pelo que "podemos desviar-nos" da neutralidade.

BCE vai discutir euro digital em julho

Lagarde adiantou aos eurodeputados que o BCE vai discutir uma nova fase na "exploração" do tema de um euro digital a 14 de julho. Mas sublinhou que uma divisa encriptada "pode trazer riscos se não for concebida e implementada de um modo adequado" e gerar "impactos negativos na estabilidade financeira ao induzir grandes transferências de dinheiro privado para o euro digital". Este risco para o sistema bancário é uma das preocupações da francesa: "Isto poderia aumentar o custo de financiamento dos bancos e, como consequência, as taxas de juro dos empréstimos bancários, reduzindo potencialmente o volume de crédito à economia".

Na visão de Lagarde, um euro digital "tem de ser desenhado mais como um meio de pagamento atrativo do que como uma forma de investimento" e que uma divisa da zona euro encriptada "tem de estar sob controlo do BCE e não de qualquer operador privado, pois o BCE garante a privacidade dos dados". Em suma, o euro digital não pode ser lançado pelo BCE para depois ser "utilizado como uma reserva de valor generalizada" ou a exploração de dados privados.

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