Economia

O que quer a Cofina para a Media Capital (e como se vai financiar e como pretende salvar o fundo de maneio)

18 fevereiro 2020 16:34

Paulo Fernandes, presidente-executivo da Cofina

clara azevedo

A Cofina vai angariar €250 milhões para a compra da dona da TVI e para renegociar a dívida já existente. Pede 85 milhões a acionistas (Paulo Fernandes vai pôr 20 milhões e Mário Ferreira outros €20 milhões) e ainda €170 milhões ao Santander Totta e ao Société Générale. Vem aí um novo grupo de media. E tem já um problema para resolver, em que aqueles dois bancos são a esperança

18 fevereiro 2020 16:34

A Cofina está a comprar a Media Capital. Para se financiar para a operação, em que pode gastar até 134 milhões de euros (10 milhões já gastou, inclusive), a empresa que detém o Correio da Manhã e a CMTV vai pedir 85 milhões de euros a atuais e novos acionistas (Paulo Fernandes e Mário Ferreira vão colocar 20 milhões cada). Mas precisa de mais dinheiro: vai ser através de uma operação financiada junto do Santander Totta e do Société Générale.

O objetivo é criar um grupo “integrado”, onde a empresa dirigida por Paulo Fernandes espera dar força às plataformas digitais, como Record e Maisfutebol, recuperar a liderança da TVI e até sonhar com a internacionalização.

O que quer a Cofina

Segundo descreve no documento em que dá a conhecer o aumento de capital, publicado esta segunda-feira à noite, a Cofina diz que, com a aquisição da Media Capital, dona da TVI e da Rádio Comercial, entre outros, vai conseguir “tornar-se num grupo integrado e mais competitivo de media em Portugal, com posição de relevo nos principais segmentos do mercado: televisão, publicação de jornais e revistas, rádio, digital e produção audiovisual”.

Há algumas áreas em que a Cofina, presidida por Paulo Fernandes, define claramente objetivos: “Nos canais abertos, recuperar a primeira posição que foi já ocupada pela TVI”, propõe-se a empresa, depois de, em 2019, a SIC (do grupo Impresa, dona do Expresso) ter tirado a liderança. Também há objetivos para a CMTV: “manter a posição de liderança” nos canais pagos. “Aproveitar as sinergias operacionais decorrentes de uma operação com maior escala no sector televisivo” é outra das indicações da Cofina, que menciona também a otimização e o desenvolvimento da produção de conteúdos.

A Media Capital é dona da TVI, de rádios (a Comercial é a principal) e ainda da produtora Plural

A Media Capital é dona da TVI, de rádios (a Comercial é a principal) e ainda da produtora Plural

foto tiago miranda

“A Cofina ambiciona reforçar a sua oferta na área digital, apostando na inovação e alavancando as plataformas já existentes detidas por si e pelo Grupo Media Capital, como sejam a TVI, o Correio da Manhã, o Record e o Maisfutebol”, menciona ainda o grupo.

Para melhorar os seus resultados operacionais, a empresa admite investir noutros segmentos de media (que não especifica), fala em consolidação e ainda na internacionalização para mercados naturais.

A empresa de media acredita que, ao adquirir a Media Capital, conseguirá encontrar poupanças de 46 milhões de euros, tendo em conta a “otimizações de recursos e potenciais reduções de custos com publicidade, programação e outros custos operacionais, bem como ganhos de eficiência com reorganização administrativa”. Não são especificados impactos no quadro de trabalhadores.

Como se vai financiar: o aumento de capital

Mário Ferreira vai investir até €20 milhões na Cofina

Mário Ferreira vai investir até €20 milhões na Cofina

lucílica monteiro

Para se concretizar a criação deste grupo, operação que já recebeu luz verde da Autoridade da Concorrência, a Cofina acordou que vai pagar 123 milhões de euros pela posição de 95% da Prisa na Media Capital (depois de ter sido revisto em baixa em dezembro por conta de uma auditoria). O preço por ação corresponde a 1,5406 euros. Deste montante, a Cofina já pagou um adiantamento de 10 milhões.

Depois disso segue-se uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre os restantes 5% do capital da Media Capital. O preço por ação é de 2,3336 euros, num total que pode custar 10,5 milhões de euros. Deste valor, o espanhol Abanca é aquele que mais recebe (10 milhões), sendo que o banco – que está a comprar o EuroBic – já adiantou que vai reinvestir esse montante no aumento de capital da Cofina.

Precisamente para enfrentar estes custos, a Cofina precisa de se financiar. Uma parcela é o aumento de capital de 85 milhões de euros, que vai trazer alterações à estrutura acionista.

Paulo Fernandes, o atual presidente executivo e que é também um dos maiores acionistas, vai assumir a liderança no capital, ao investir 20 milhões que lhe dão, segundo a projeção da própria empresa, cerca de 20%. Mário Ferreira também vai colocar outros 20 milhões e, se conseguir comprar todas as novas ações a que se propôs, chega a uma participação de 15%. O Abanca, cumprindo aquele reinvestimento prometido, chega aos 7,6%.

Do aumento de capital de 85 milhões, cerca de 84,3 milhões “será alocado ao financiamento da operação de aquisição do Grupo Media Capital”, indica o prospeto.

Como se vai financiar: o Santander e o Société Générale

“A restante parcela do preço de aquisição, de aproximadamente € 39 milhões, vai ser financiada através do financiamento sindicado no montante total de € 170 milhões”, acrescenta o documento.

O financiamento está já acordado entre a Cofina e dois bancos desde setembro: o Banco Santander Totta e a sucursal espanhola do Société Générale. O financiamento deve ser realizado através da emissão de obrigações que vão ser subscritas pelos bancos. Têm um prazo de cinco anos. “A taxa de juro prevista corresponde à taxa Euribor a 6 meses, com um mínimo de 0%, acrescida de um spread de 3,5% aplicável durante os primeiros 12 meses”, revela o comunicado. Nos anos seguintes, o spread pode variar entre 3,5% e 2,75%, dependendo do diferencial entre a dívida líquida e os resultados operacionais (EBITDA).

Assim, restam ainda cerca de 130 milhões (aos quais tem de se descontar os custos próprios como comissões) para o refinanciamento das dívidas dos dois grupos. No final de setembro, os empréstimos obtidos pela Cofina ascendiam a 52 milhões, enquanto os da dona da TVI estavam na ordem dos 75 milhões.

Este financiamento da Cofina junto dos bancos só avança depois do aumento de capital.

Em suma, a Cofina vai angariar 255 milhões (85 milhões de aumento de capital e 170 milhões do sindicato bancário), valor em que há custos e comissões de 7,8 milhões de euros. O valor vai ser utilizado para a compra (115 milhões – já deu o referido adiantamento de 10 milhões) e para amortizar os créditos da Cofina e Media Capital (127 milhões).

Apesar dos custo da aquisição e do financiamento obtido, a Cofina livra-se de eventuais encargos judiciais relativos à Media Capital, tendo direito a ser indemnizada em alguns casos (não especificados).

Pedro Castro e Almeida é presidente executivo do Santander Totta, que, juntamente com o Société Générale, vai financiar a Cofina

Pedro Castro e Almeida é presidente executivo do Santander Totta, que, juntamente com o Société Générale, vai financiar a Cofina

antónio cotrim/lusa

Os problemas no fundo de maneio

Com esta operação, a Cofina enfrenta um problema, que tem de resolver: a insuficiência do fundo de maneiro (a diferença entre ativos correntes e passivos correntes, que mostra a capacidade de uma empresa assegurar as suas necessidades com o que tem). Ora, a Cofina assume que este fundo “não é suficiente” para suprir as necessidades nos próximos 12 meses, estimando-o em 11,5 milhões negativos após a conclusão da compra e da oferta pública de aquisição.

O objetivo da Cofina é conseguir suprir “eventuais insuficiências” através da renegociação da dívida existente, alargando o financiamento conseguido junto do Santander Totta e do Société Générale (agora nos 170 milhões) ou, então, através de novas linhas de crédito abertas "de acordo" com esses bancos.

Aumento de capital demora um mês

Para já, o que avança é o aumento de capital. Esta operação vai arrancar já esta semana. Até esta quinta-feira podem adquirir-se ações que continuam a dar direitos de preferência na subscrição das novas ações que vão ser emitidas (no valor global dos 85 milhões). Esses direitos depois podem ser negociados e trocados em bolsa entre 25 de fevereiro e 5 de março. Já as ordens para a aquisição das novas ações iniciam-se a 25 de fevereiro e vão até 10 de março.

A 13 de março as novas ações já são admitidas à negociação, pelo que, aí, já estará consumada a alteração acionista.

Depois disso, pode avançar o financiamento junto dos bancos, pode concretizar-se a compra à Prisa da maioria da Media Capital e pode ser lançada a OPA sobre o restante capital.